por Marília Pontes
No segundo dia do evento Rio Moda Discute Internacional 2016 – RMDI, realizado pelo Instituto Rio Moda no Fashion Mall/Rio de Janeiro, o tema “A Música que você veste” foi discutido na mesa composta pela stylist Letícia Cazarré, pela fotógrafa Lu Gomes e pela maquiadora e cantora Sabrina San, com a mediação de Alessandra Marins.
No segundo dia do evento Rio Moda Discute Internacional 2016 – RMDI, realizado pelo Instituto Rio Moda no Fashion Mall/Rio de Janeiro, o tema “A Música que você veste” foi discutido na mesa composta pela stylist Letícia Cazarré, pela fotógrafa Lu Gomes e pela maquiadora e cantora Sabrina San, com a mediação de Alessandra Marins.
Sabrina San, Lu Gomes, Alessandra Marins e Letícia Cazarré. Foto: Marilia Pontes
Letícia
Cazarré contou que sua primeira formação é em Biologia e sua entrada no
mundo da Moda ocorreu depois de casar e ter dois filhos. Seu pontapé inicial
foi fazer um curso de consultoria de imagem online do Fashion Institute of Technology – FIT (Nova Iorque), além de
workshops no Instituto Rio Moda. Com isso, ela começou a vestir algumas atrizes
que ela conheceu por intermédio de seu marido, o ator Juliano Cazarré. À medida
que foi ganhando experiência na profissão, percebeu que tinha uma preferência
por editoriais, nos quais ela busca
apostar no trabalho de novos designers. Em 2015, ela lançou a revista colaborativa
´CAUSE Magazine, que é o seu novo foco na carreira e inclui trabalhos de todos
os tipos de arte, dentre elas, a Música. Inclusive, ela adiantou que a próxima
edição trará Ney Matogrosso na capa!
Lu
Gomes é estilista e, posteriormente, começou a atuar como fotógrafa. Em
função disso, enquanto estava em Nova Iorque fazendo registros de shows de
bandas de seus amigos, ela acabou por se envolver com a atividade de styling
dos seus integrantes. Nesse métier,
ela conseguiu juntar Moda e Música. Além desse segmento, ela também atua na fotografia de backstage de desfiles de Moda, que ela afirma ser um ambiente
mais flexível e rico para exercitar seu olhar artístico de diferentes formas,
possibilitando entender melhor o funcionamento dos desfiles e a emoção que o
envolve. Lu também esclareceu que a fotografia de Moda pode ser explorada de
forma específica, seja no backstage,
no street style ou na passarela.
Sabrina
San, cuja participação ocorreu de uma surpresa, pois não estava programada,
é cantora da banda Kita e maquiadora. Além de já ter participado do programa
Superstars, de competição entre bandas, ela e sua trupe também já abriram o
show do Marilyn Manson em um festival de música. Nessa ocasião, por exemplo,
ela contou que não sabia qual a roupa apropriada para vestir. Por conta disso,
atualmente, ela conta com a ajuda de Lu Gomes e de outros amigos para se produzir,
a fim de não ter somente a visão dela nas apresentações. Além disso, ela revelou
que há alguns parâmetros a serem seguidos para quem está no palco – como não
usar transparência ou branco, adotar padronagens grandes, poder se movimentar
com a roupa – e a a banda Kita também tem
uma lista de itens que não podem ser usados, dentre eles estão boné, camisa
de futebol etc. Seu interesse pela Moda sempre esteve presente na sua vida,
pois pesquisava sobre o assunto e escrevia artigos para o site de sua amiga. Como maquiadora, participou de desfiles e
começou a entender o porquê da estética escolhida para cada um deles, o que fez
com que se encantasse ainda mais por esse universo.
Durante a discussão, Letícia Cazarré
foi questionada por Alessandra Marins e disse que stylists têm dúvidas e, no
caso dela, o método adotado é buscar solucioná-la sozinha através de estudo e
seleção de referências. Quando se trata de uma questão sobre o guarda-roupa
masculino, ela pede auxílio ao marido, que é bem informado sobre Moda, embora
não tenha formação técnica na área. Ela acrescentou – confirmando com o que
Carol Roquete havia dito no talkshow [MPF1] do dia anterior – que styling é um longo processo e que envolve parceria. É essencial que
as pessoas se questionem sobre o que e como querem expressar uma imagem e qual
o objetivo delas com isso. A partir dessa definição, a busca por marcas que representem essa identidade se torna mais
prática, embora novos artistas tenham dificuldade em conseguir roupas
emprestadas, o que pode indicar que o mercado ainda não está preparado para
absorver essa demanda. Como resultado disso, no caso da Música, está
exposto à opinião do público, é também necessário que o artista e o stylist
estejam preparados para as críticas, sejam elas boas ou ruins.
Sobre a extensão da influência de
artistas musicais na Moda, todas comentaram a recente escolha de Beyoncé como ícone fashion pelo Council of Fashion Designers of America
– CFDA e comentaram o efeito semelhante causado pelo grunge, na década de
1980, como uma quebra de paradigma na Moda introduzida pela Música. Atualmente,
a Geração Tombamento - que, dentre
seus artistas, tem Liniker, Karon Conká e Johnny Hooker -, tem resgatado essa
influência na Moda, se associando a diversas marcas que apoiam as questões
pelas quais lutam: raça, gênero e sexualidade.
O talkshow do dia teve como tema “Pesquisa e Curadoria: música e atmosfera em Moda”, pesquisa para
concepção e coleta de materiais para um acervo, editorial ou exposição e a
curadoria para edição e tomada de decisões sobre aquele processo. Participaram
dele Victoria Broackes (curadora
sênior do Victoria & Albert Museum), Patrícia
Carta (publisher da Harper´s Bazaar)
e Jackson Araújo (consultor
criativo), com a mediação da jornalista Maria
Prata. Assim como no dia anterior, Roberto Meireles deu a primeira palavra
dessa etapa do RDMI e falou sobre cocriação.
Além da confiança, sobre a qual ele já tinha comentado no dia 28/06/2016, é
necessário desenvolver o desapego, a generosidade e trabalhar a própria
identidade quando se está nesse processo colaborativo. Embora delicado, é algo
que gera muita aprendizagem e faz com que o resultado final se torne muito
melhor para todos. Aquela foi uma palavra chave na concretização do RDMI e
Maria Prata acrescentou que a Música e a Moda têm permitido essa troca saudável
num ambiente de cocriação, principalmente porque a primeira é a expressão
cultural de maior acessibilidade e alcance popular.
Maria Prata. Foto: Marilia Pontes
Jackson
Araújo, em conjunto com Hiluz del Priore, foi responsável pela curadoria do
RMDI 2016. Ele explicou que, para a concepção do projeto “A Música que você
veste”, foram selecionados oito movimentos musicais com reflexos na Moda no
século XX, tais como:
- dos anos 1950 até 1990, desde
Elvis aos Clubkids: a rebeldia, os clubes e a transgressão;
- woman power, com Madonna e Beyoncé: influência no comportamento, na
forma da lidar com o corpo, em como se vestir, formação de legados;
- chaming man inspirado na música homônima do The Smiths, com Justin
Timberlake, Pharrel Williams: se cuida e veste bem, comportamento sociável;
- mixed media em que pop stars começam a participar de revistas e
passarelas;
-
label stars em que ações de marketing
e mídia são direcionadas para promover ações de cantores criadores de linhas de
peças do vestuário ou se tornam embaixadores de marcas de Moda;
- Brazil now que ocorre com o surgimento de novos estilos
brasileiros, com artistas investindo em produção de imagens (como Tiago
Pethit), seja por si ou com a contratação de stylists especializados, dentre
outros.
Transgressão e o poder da autoimagem,
empoderamento e a quebra de padrões de certo/errado, bonito/feito; e política
sexual fazem parte do universo do jovem como atitude. Então, Jackson destacou
que o objetivo da pesquisa foi compreender justamente a mudança desse
comportamento, pois, como a juventude
sempre foi o maior sinal da apropriação de estilos unindo Moda e Música, nela é
aonde se percebe o zeitgeist (espírito do tempo). Assim, a estrutura
apontada acima, ajudou a dar um embasamento teórico para o evento de 2016.
Patrícia
Carta, por sua vez, acrescentou que, ao seu ver, esse movimento jovem, no
século XX, poderia ser apontado desde quando o ritmo Charleston influenciou o
traje feminino na década de 1920. Ela, que é publisher da Harper´s Bazaar, que foi parceira do RMDI, trouxe
diversos exemplo de editoriais dessa revista que juntaram Moda e Música.
Patrícia Carta e
apresentação sobre os anos 1970. Foto: Marilia Pontes
Além da recente capa com Anitta,
Vivienne Westwood foi lembrada por sua ligação com o punk – amplamente
trabalhado em suas coleções – e seu legado hippie politizado, que influencia
suas criações. Os clubes londrinos dos anos 1980 foram lembrados como locais em
que os frequentadores precisariam estar bem vestidos e suficientemente
interessantes para serem admitidos pelos hosts,
assim como o foram os Rolling Stones que são sempre performáticos. Pharrel
Williams que não é só inovador na Música, mas também exercita essa sua
característica na Moda: sem falar nos tênis com a Adidas, ele também lançou uma
linha de jeans feitos de garrafas PET retiradas do oceano para G-Star.
Em sua exposição, Patrícia lembrou alguns nomes da Música e
das artes que foram símbolos de estilo para a Moda, tornando-se marcos para as
sinergias entre elas:
- 1920: Josephine Baker (dançarina e
é considerada a primeira mulher negra a ter reconhecimento nas artes cênicas)
-
1930: Marlene Dietrich (atriz e cantora no cinema)
-
1940: Carmen Miranda e Rita Hayworth
-
1950: Elvis Presley e James Dean
- 1960: The Beatles e Rolling Stones
- 1970: David Bowie, Janis Joplin e Jimi Hendrix
- 1980: Madonna, Boy George e Debbie Mary
- 1990: Nirvana e Run-DMC
- 2000: M.I.A., Gwen Stefani, Rihanna e Kanye West
Em
seguida, Victoria Broackes deu
início a sua apresentação que abordou a exposição “David Bowie IS” pela qual
ela foi a curadora responsável no Victoria
& Albert Museum. Vale destacar que esse museu possui um enorme acervo
de Moda e, desde sua fundação, a apoiou, assim como o fez às artes e,
principalmente, ao design.
David
Bowie foi uma inspiração, um ícone, um artista completo e um recordista de
vendas no Reino Unido. A exposição sobre ele começou a ser planejada dois anos
antes de sua abertura em 2013 e já nasceu com uma proposta de ser inovadora
envolvendo teatro, performances e experiências sensoriais. Nada mais justo foi
o título escolhido para ela seguir essa mesma linha provocativa.
De
um total de 27 mil objetos – que, dentre eles, 5 mil eram pessoais de David,
que permitiu livre acesso aos organizadores -, somente 300 estavam expostos,
incluindo alguns, como quadros de Andy Warhol, do Expressionismo alemão, que serviram
para situar o expectador artisticamente. Além disso, da parte do figurino de
Bowie, a exposição contou com peças seja de tecido da Liberty London;
inspiradas no filme Laranja Mecânica (1971); criadas por Yohji Yamamoto (1989);
ou baseadas no glam rock, no
Dadaísmo...enfim, havia muitas referências criativas relacionadas a David. Inclusive,
para poderem mostrar devidamente essas peças, o museu esculpiu manequins do
tamanho desse cantor, do corpo inteiro e também dos pés, para permitiu um
caimento perfeito.
A
exposição foi um sucesso e está rodando o mundo inteiro. Victoria esclareceu
que a escolha sobre o que entraria ou não na exposição foi a parte mais
difícil, mas eles buscaram focar no processo criativo de David Bowie e optar
pelos artigos que pudessem contar mais de uma história com seu contexto. Ela também contou que Bowie não participou
do processo de concepção e montagem dela, mas aprovou o resultado! A
próxima exposição que o museu receberá e está sendo organizada por Victoria tem
como tema o final dos anos 60 e a Revolução, trazendo como pontos focais
artistas como os Beatles, autoritarismos, ideais, otimismo e o impossível se
tornando realidade.
Exposição “David
Bowie IS”. Foto: Marilia Pontes
Veja o resumo do dia 1 clicando aqui
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